Quem vai onde?!
Bravos Advogados Estagiários, lembrais-vos das aulas de deontologia? Lembrais? Ou a memória bloqueou-vos todas as recordações desses tempos, e é tudo um grande branco? Afastem-se da luz!
Eu recordo momentos. Tenho flashes. Ninguém me disse que isto ia ficar para sempre! Acordo de noite. Afogado em suores frios. Às vezes aos gritos. E em algumas alturas até estou sozinho na cama.
Dessas aulas lembro-me de dois ensinamentos absolutamente essenciais, sem os quais, disso me convenço, não poderia nunca singrar na nobre profissão da Advocacia. Deixem-me partilhá-los convosco: 1) o advogado mais novo é o que se desloca ao escritório do advogado mais velho; 2) são proibidos os pactos de quota litis.
Lá aprender o princípio, eu aprendi. Mas tenho imensas dúvidas. Tentem acompanhar-me, com a paciência que é devida aos discípulos.
Desta vez vou só dedicar-me a quem vai onde.
Dizem os pareceres, que aplicaram a doutrina, que comentou o Estatuto da Ordem dos Advogados (que é como quem diz, a Bíblia, ou o Corão, ou o Borda d’Água, ou o Mundo de Mafalda), que o que releva é a inscrição mais antiga na OA e não a idade do Advogado. E acham que com isso ficam sanadas todas as dúvidas que existam, e acauteladas todas as que possam vir a ocorrer. Mas não. Só eu tenho várias.
1ª dúvida: mas e se o Advogado esteve suspenso? Deve descontar-se esse período para calcular a idade da inscrição?
2ª dúvida: e fará diferença ter sido a suspensão sua sponte ou em resultado de processo disciplinar, regularmente iniciado, conduzido e concluído pelos órgãos competentes (competentes órgãos?) da OA?
3ª dúvida: e se tiver sido aberto o procedimento e o Advogado, antes do processo concluído, tiver suspendido a sua inscrição na OA por causa disso? E se não tiver sido por causa disso?
4ª dúvida: e se for um Advogado estrangeiro? Conta a data da sua inscrição na respectiva OA [suponho que a OA não é um castigo divino aos Estagiários portugueses, embora, confesso, não a distinga muito claramente do Grande Dilúvio]? Ou será que este tempo de inscrição começa só a contar a partir do momento em que começou a exercer em Portugal?
5ª dúvida: e se o Advogado mais velho está inscrito há muito tempo, mas nunca exerceu? Deve atender-se ao tempo de inscrição ou ao tempo que ele efectivamente praticou? E não seria melhor determinar um limite mínimo anual de intervenções em tribunal, para efeitos de cálculo dos anos em que andou a advogar por aí? Por exemplo: num ano, um Advogado deve ter pelo menos 27 presenças em tribunal. Pode pedir-se ao Meritíssimo Juiz em Direito que assine e carimbe uma folhita de presença ao Senhor Doutor Advogado. Se não tiver essas presenças, não se considera, para este fim, a sua inscrição. Contempladas que fossem as devidas excepções. Podia até fazer-se um regulamentozinho jeitoso a este propósito.
6ª dúvida: e se o Advogado mais velho tiver escritório em Faro mas passar a vida no tribunal de Chaves, onde o Advogado mais novo houve por bem estabelecer-se? Têm que ir ambos a Faro? E em carros separados? E o mais velho à frente?
7ª dúvida: e se o Advogado mais novo se quiser deslocar ao escritório do mais velho com um outro Advogado, mais velho que ambos? Tem que deixar o venerando Advogado com a porteira? Ou tem que pedir-lhe que apanhe o 23, que tem uma paragem lá perto? Ou tem que lhe explicar que, desde que comemorou os 120 anos de carreira, a cabeça não o tem ajudado?
E com todas estas dúvidas, estou ao telefone com o M.I. Colega, a tentar encontrar um lugar neutro.
- Ah, e tal, a gente encontra-se no Manel dos Petiscos, e coiso!
É que se sugiro encontrar-me no escritório do Colega, ele pensa logo:
- Eh lá! Com a breca! Este rapaz pensa que sou idoso! A minha Maria está a envelhecer-me mais do que aquilo que eu pensava!
Já se peço que o M.D. Colega se desloque ao meu escritório, ouve-se um risinho paternalista do outro lado do bocal:
- Eh! Eh! Eh! [... pausa ...] Eh! Ó Colega, será melhor vir cá o Senhor Doutor, sendo mais jovem, e assim!
No meio destas confusões e dúvidas, já não sei quem é o meu cliente, qual de nós tem razão, porque é que telefonei nem se se espera que faça uma contestação ou uma operação de peito aberto.
Advogado mais novo visita advogado mais velho. Senhores Doutores Advogados, expliquem-se!
Eu recordo momentos. Tenho flashes. Ninguém me disse que isto ia ficar para sempre! Acordo de noite. Afogado em suores frios. Às vezes aos gritos. E em algumas alturas até estou sozinho na cama.
Dessas aulas lembro-me de dois ensinamentos absolutamente essenciais, sem os quais, disso me convenço, não poderia nunca singrar na nobre profissão da Advocacia. Deixem-me partilhá-los convosco: 1) o advogado mais novo é o que se desloca ao escritório do advogado mais velho; 2) são proibidos os pactos de quota litis.
Lá aprender o princípio, eu aprendi. Mas tenho imensas dúvidas. Tentem acompanhar-me, com a paciência que é devida aos discípulos.
Desta vez vou só dedicar-me a quem vai onde.
Dizem os pareceres, que aplicaram a doutrina, que comentou o Estatuto da Ordem dos Advogados (que é como quem diz, a Bíblia, ou o Corão, ou o Borda d’Água, ou o Mundo de Mafalda), que o que releva é a inscrição mais antiga na OA e não a idade do Advogado. E acham que com isso ficam sanadas todas as dúvidas que existam, e acauteladas todas as que possam vir a ocorrer. Mas não. Só eu tenho várias.
1ª dúvida: mas e se o Advogado esteve suspenso? Deve descontar-se esse período para calcular a idade da inscrição?
2ª dúvida: e fará diferença ter sido a suspensão sua sponte ou em resultado de processo disciplinar, regularmente iniciado, conduzido e concluído pelos órgãos competentes (competentes órgãos?) da OA?
3ª dúvida: e se tiver sido aberto o procedimento e o Advogado, antes do processo concluído, tiver suspendido a sua inscrição na OA por causa disso? E se não tiver sido por causa disso?
4ª dúvida: e se for um Advogado estrangeiro? Conta a data da sua inscrição na respectiva OA [suponho que a OA não é um castigo divino aos Estagiários portugueses, embora, confesso, não a distinga muito claramente do Grande Dilúvio]? Ou será que este tempo de inscrição começa só a contar a partir do momento em que começou a exercer em Portugal?
5ª dúvida: e se o Advogado mais velho está inscrito há muito tempo, mas nunca exerceu? Deve atender-se ao tempo de inscrição ou ao tempo que ele efectivamente praticou? E não seria melhor determinar um limite mínimo anual de intervenções em tribunal, para efeitos de cálculo dos anos em que andou a advogar por aí? Por exemplo: num ano, um Advogado deve ter pelo menos 27 presenças em tribunal. Pode pedir-se ao Meritíssimo Juiz em Direito que assine e carimbe uma folhita de presença ao Senhor Doutor Advogado. Se não tiver essas presenças, não se considera, para este fim, a sua inscrição. Contempladas que fossem as devidas excepções. Podia até fazer-se um regulamentozinho jeitoso a este propósito.
6ª dúvida: e se o Advogado mais velho tiver escritório em Faro mas passar a vida no tribunal de Chaves, onde o Advogado mais novo houve por bem estabelecer-se? Têm que ir ambos a Faro? E em carros separados? E o mais velho à frente?
7ª dúvida: e se o Advogado mais novo se quiser deslocar ao escritório do mais velho com um outro Advogado, mais velho que ambos? Tem que deixar o venerando Advogado com a porteira? Ou tem que pedir-lhe que apanhe o 23, que tem uma paragem lá perto? Ou tem que lhe explicar que, desde que comemorou os 120 anos de carreira, a cabeça não o tem ajudado?
E com todas estas dúvidas, estou ao telefone com o M.I. Colega, a tentar encontrar um lugar neutro.
- Ah, e tal, a gente encontra-se no Manel dos Petiscos, e coiso!
É que se sugiro encontrar-me no escritório do Colega, ele pensa logo:
- Eh lá! Com a breca! Este rapaz pensa que sou idoso! A minha Maria está a envelhecer-me mais do que aquilo que eu pensava!
Já se peço que o M.D. Colega se desloque ao meu escritório, ouve-se um risinho paternalista do outro lado do bocal:
- Eh! Eh! Eh! [... pausa ...] Eh! Ó Colega, será melhor vir cá o Senhor Doutor, sendo mais jovem, e assim!
No meio destas confusões e dúvidas, já não sei quem é o meu cliente, qual de nós tem razão, porque é que telefonei nem se se espera que faça uma contestação ou uma operação de peito aberto.
Advogado mais novo visita advogado mais velho. Senhores Doutores Advogados, expliquem-se!
0 Comments:
Enviar um comentário
<< Home