12 outubro 2006

Com Bolonha é que é!

No site da OA, ou do FORMARE, está o resumo do pensamento do Digníssimo Bastonário quanto ao processo de Bolonha: concorda.

Porém, entende que o Governo deve clarificar qual o "ciclo de estudos necessários". Confesso: não conheço o processo ao pormenor. Ainda assim, não sei que me parece o comentário. O que se pretende com Bolonha é, precisamente, uniformizar o plano de estudos nas faculdades europeias, pelo que qualquer decisão, diria eu, que não sei nada disto, não depende (só) do Governo, que com tanta autoridade assim é intimado a explicar-se.

O sistema de ciclos de estudos parece já ser conhecido: licenciatura de três ou quatro anos, mestrado de um ou dois, doutoramento de pelo menos três. O plano curricular há-de depender de cada Universidade. Parece que são autónomas. E tudo e tudo.
Mas o Mui Ilustre Bastonário quer saber mais. E com razão, que o saber não ocupa lugar. Diz que é para garantir que não há degradação da carreira.

Senhor Bastonário, Mui Digno Bastonário, degradante é passar três anos a estagiar para aquecer. É ficar sujeito ao numerus clausus que uns senhores entendem fixar. É passar 8 anos na expectativa de ser autorizado a exercer uma profissão. E não ser.
Mas desde que seja a OA a fazê-lo não há problema. Um pai pode corrigir um filho, um estranho é que não.

Manifestou também Sua Excelência, o Mui Distinto Bastonário, a intenção de a OA só aceitar futuros candidatos a Advogados com o grau de mestre, ou seja, com os mesmos cinco anos de faculdade que agora. A mudança é claramente uma coisa que faz muita confusão à Veneranda OA.

Mas um velho de aspeito venerando,
Que ficava nas praias, entre a gente,
Postos em nós os olhos, meneando
Três vezes a cabeça, descontente,
A voz pesada um pouco alevantando,
Que nós no mar ouvíamos claramente,
C’um saber só de experiências feito,
Tais palavras tirou do experto peito.
Luís de Camões, Os Lusíadas

Diminui-se o tempo da licenciatura, aumenta-se o do estágio, que de dezoito meses passou para vinte e quatro. Três anos são suficientes para a licenciatura, mas não para aceder à OA.

Pois claro, estamos sempre a aprender. E as leis estão sempre a mudar. E nunca se sabe de mais. E a vida é uma constante aprendizagem. E parar é morrer. Tudo verdade.
Proponho que se estabeleça um estágio perpétuo. Não pago, como é óbvio. Vamos de encontro à essência da profissão, aos princípios de Cícero, à justiça administrada pelos homens justos e bons, à proibição de retribuição, que mancha as mãos puras e desinteressadas da justiça e dos justiceiros. E tudo e tudo.

E disse assi: - “Ó Padre, a cujo império
Tudo aquilo obedece que criaste;
Se esta gente que busca outro Hemisfério,
Cuja valia e obras tanto amaste,
Não queres que padeçam vitupério,
Como há já tanto tempo que ordenaste,
Não ouças mais, pois és juiz de direito,
Razões de quem parece que é suspeito.
Luís de Camões, Os Lusíadas

A razão principal para a concordância do Mui Prezado Bastonário com Bolonha parece ser o facto de que “permite a aplicação junto dos estudantes de Direito do provérbio que diz “se vires um pobre não lhe dês o peixe, ensina-o a pescar””.

Suponho que outros provérbios poderiam ser aplicados com igual (nenhuma) acuidade: “a cavalo dado não se olha o dente”, “água mole em pedra dura, tanto dá até que fura”, “quem se mete em atalhos, mete-se em trabalhos”, “quem casa quer casa”.

Que raio se quererá dizer com isto? Faz falta uma Engenharia em Sabedoria Popular, variante A Ser Usada Por Advogados e Outros Profissionais do Direito, com especialização em A Ser Usado Quando Se Não Quiser Dizer Nada.

Por tentativas:
a) então, um curso de cinco anos é inútil, é dar o peixinho aos meninos? Enfim, vender, por uma quantia simbólica a título de propinas, que só não é maior porque a lei não deixa. É agora, em menos tempo, nestes três anos, que se vão realmente formar juristas?

b) então, cinco anos é demasiado, é um esbanjamento? Em três é que todos vão aproveitar para bem ensinar tudo o que é necessário?

c) então, se em três anos nos vão ensinar a pescar, finalmente, o que nos vão ensinar nos outros três de estágio na OA?

d) então, antes cinco anos eram inúteis, mas seis, contando com o estágio, não são?

Ainda sou do tempo em que não ensinavam a pescar na Faculdade: não percebi.



1 Comments:

Anonymous Anónimo said...

Ora nem mais. É caso para dizer que para bom entendedor meia palavra basta. E a palavra do Sacrossanto Bastonário é bem clara para quem o quiser entender...Trabalha filho trabalha que o teu trabalhinho é lindo!!!

16 outubro, 2006  

Enviar um comentário

<< Home