08 outubro 2006

Enrabu!

Há alguns anos, catalogou-se uma geração de rasca. Agora, as criancinhas cresceram, e a mesma geração passou a chamar-se canguru. Até podia tentar explicar o que é um menino rasco. Mas nunca percebi muito bem. Não sei se o facto de eu próprio ser dessa geração influencia esta ignorância.

- Sfiiif sfiiif ssssiiiiiiifff sssfiiiiffffiifiii...

Acho que se queria dizer que os jovenzinhos não têm valores, não respeitam ninguém, não sabem o que custa a vida. Putos mimados.
A geração anterior era a dos bravos de Abril, esta é a dos abusadores de Abril.

- Andei eu a ser torturado, para o raio do puto fazer um piercing!

Abusam da liberdade. Não sabem o que ela custa. Acham que o dinheiro nasce no multibanco. Não dão valor ao trabalho.

Agora, aí está a geração canguru.

- Canguru, diz-me tu quantos pêlos tens tu... no nariz! Can-gu-ru!!

Chamam-lhe assim porque diz que não há maneira de os moços saírem de casa dos pais. Diz que não querem sair da bolsa marsupial. Ergo, cangurus.

Os senhores intelectuais cruzam a perna, bafejam o cachimbo, puxam a barba vetusta, descaem os óculos ilustres, põem uma mão sobre o joelho e filosofam quanto às dificuldades que eles passaram. Porque naquele tempo é que era. Sair da escola com a 4ª classe e ir trabalhar. Ou sair de casa dos pais para a do padrinho que tinha um negócio na cidade.

- Pois é!

Senhores que gostais de catalogar, tomai tendo! Noutros tempos, não era necessária frequência universitária para conseguir emprego. Hoje também começa a ser relativamente indiferente ter ou não formação universitária. Passámos a vida a ouvir gritar os paizinhos de como era importante estudar muito e tirar um curso e ser muito ajuizado. Não é bem assim.

Concluir um curso, arranjar trabalho, garantir o emprego, conseguir uma casa demora sete anos. Nove, se forem licenciados em direito, e fizeram o inútil estágio à primeira volta.
Não há dinheiro. Não é que os jovenzinhos sejam preguiçosos, que sejam irresponsáveis, que apreciem que a mãe lhes confisque as revistas pornográficas. É necessário. E embaraçoso. Um marmanjão de trinta anos a morar com os pais não impressiona uma mocinha de boas famílias.

- O meu paizinho quer saber como me vais sustentar.

Disseram que era necessário um curso. Disseram que Direito era bom. Disseram que era uma profissão nobre. Disseram que seriam cinco anos, e depois era uma casa com piscina, um BMW à porta e as férias que quisesse.
Afinal a faculdade é um ensaio para o estágio que há-de vir. E ficar.
Nem há trabalho, nem casa com piscina, nem BMW, nem férias.
Mais do que uma geração canguru é, como dizia o outro, uma geração enrabu.