No divã
A OA anda deprimida. Não aparece em todos os serviços noticiosos, não suscita polémicas nos órgãos de comunicação. Mesmo correndo um sério risco de ser já o próximo bastonário, atrevo-me:
- A OA parece um 727 a voar sem piloto!
A OA não anda bem! Ora, como não tem amigos, sugiro que consulte um psicólogo. Só para a gente saber com o que conta, que Diabo! Aparentemente, o comportamento da OA não faz sentido. A um olhar menos atento, poder-se-ia pensar que as suas acções são comandadas pela maldade, pelo simples gosto de causar prejuízo. Mas tentemos contextualizar. Talvez seja possível criar alguma empatia com a OA.
O problema é que a OA não sabe acabar. Não é só acabar-se. Acabar os assuntos em geral.
Não saber terminar é muito frequente. Acontece a todos quando nos despedimos sete vezes antes de desligarmos a chamada.
- Então adeus! Beijinhos! Eu depois ligo-te! Ou dou-te um toque! Até logo! Beijinho! Tchautchautchautchaut!
Acontece a realizadores de cinema, perdidos em trilogias, e segundas partes, e continuações dos seus filmes. Ou quando prolongam o filme para além do fim da sua história. Como no Titanic, realizado por James Cameron. No final, passamos a odiar a simpática velhinha, sobrevivente da tragédia... E tudo e tudo. A velha nem dorme, nem salta do navio, nem atira a porcaria da jóia borda fora.
Acontece a escritores que não sabem como despedir-se das suas personagens. Não é tão fácil quanto alguns o fazem parecer.
- De modo que estás sem mulher...
Basílio teve um sorriso resignado. E, depois de um silêncio, dando um forte raspão no chão com a bengala:
- Que ferro! Podia ter trazido a Alphonsine!
E foram tomar xerez à Taverna Inglesa.
Eça de Queirós, O Primo Basílio
Acontece a ilustríssimos professores quando, por exemplo, tentam explicar a diferença entre omissões relevantes ou não, para efeitos de responsabilidade penal.
- A OA parece um 727 a voar sem piloto!
A OA não anda bem! Ora, como não tem amigos, sugiro que consulte um psicólogo. Só para a gente saber com o que conta, que Diabo! Aparentemente, o comportamento da OA não faz sentido. A um olhar menos atento, poder-se-ia pensar que as suas acções são comandadas pela maldade, pelo simples gosto de causar prejuízo. Mas tentemos contextualizar. Talvez seja possível criar alguma empatia com a OA.
O problema é que a OA não sabe acabar. Não é só acabar-se. Acabar os assuntos em geral.
Não saber terminar é muito frequente. Acontece a todos quando nos despedimos sete vezes antes de desligarmos a chamada.
- Então adeus! Beijinhos! Eu depois ligo-te! Ou dou-te um toque! Até logo! Beijinho! Tchautchautchautchaut!
Acontece a realizadores de cinema, perdidos em trilogias, e segundas partes, e continuações dos seus filmes. Ou quando prolongam o filme para além do fim da sua história. Como no Titanic, realizado por James Cameron. No final, passamos a odiar a simpática velhinha, sobrevivente da tragédia... E tudo e tudo. A velha nem dorme, nem salta do navio, nem atira a porcaria da jóia borda fora.
Acontece a escritores que não sabem como despedir-se das suas personagens. Não é tão fácil quanto alguns o fazem parecer.
- De modo que estás sem mulher...
Basílio teve um sorriso resignado. E, depois de um silêncio, dando um forte raspão no chão com a bengala:
- Que ferro! Podia ter trazido a Alphonsine!
E foram tomar xerez à Taverna Inglesa.
Eça de Queirós, O Primo Basílio
Acontece a ilustríssimos professores quando, por exemplo, tentam explicar a diferença entre omissões relevantes ou não, para efeitos de responsabilidade penal.
- Imaginem: vemos uma pessoa a afogar-se. Qual é a nossa responsabilidade se nada fizermos, se não lhe atirarmos uma bóia? E se não estava mais ninguém que pudesse atirar a bóia? E se atirarmos a bóia e, quando o sujeito está quase a agarrá-la, nós puxamos a bóia? E se a bóia estivesse mesmo ao seu alcance quando tiramos a bóia? Portanto, atiramos a bóia, puxamos a bóia, tiramos a bóia. Ou deixamos ficar a bóia. E estendemos a bóia, e voltamos a tirar a bóia. E agarramos a bóia.
Esta dificuldade em terminar tudo, na OA, tem diversas manifestações. Os senhores entendidos no assunto decidiram que eram necessários cinco anos para aprender o essencial sobre leis. Não mais. Não menos. Recentemente, outros senhores entendidos decidiram que, afinal, três bastariam. Não mais. Não menos.
Suponho (espero) que o plano curricular seja decidido de forma semelhante. Uma cadeira é essencial. Uma deve ser anual. Outra semestral. Não mais. Não menos. O Senhor Professor Doutor há-de ter um método semelhante para ocupar o seu tempo.
- 20 horas para estudar a evolução do instituto no direito romano, 4 horas para estudar a lei em vigor, 2, se houver tempo, para a proposta de lei que se prepara. Não mais. Não menos.
Depois de toda esta gente a ponderar, a estudar, vêm os Senhores da OA, com a sua argumentação característica, baralhar tudo.
- Ah, e tal! A gente esteve para aqui a pensar, e coiso! E se for como a gente pensa... A coisa... Portanto, entendemos que é melhor! E assim! Decidimos isto! E tudo e tudo!
Decidem que a faculdade não chegou. Decidem que os exames não chegaram. Só mais um. Como uma conversa que nunca acaba, como se ficasse sempre qualquer coisa por dizer. Ou perguntar.
- Qual o último dia do prazo?
- E qual o terceiro dia?
- E qual o quinto?
- E qual o décimo?
- Só mais uma, vá lá: qual o segundo?
A OA sabe que assim que for possível todos vão abandoná-la. E agarra-se enquanto pode a essa presença. É medo de estar só. É um querer companhia. É um querer ser amada. É um querer partilhar com os outros. É um querer iluminar a vida dos outros. Está sozinha. E fará o que puder para nos manter junto dela. Nem que tenha que inventar mais exames, mais aulas, mais intervenções, mais um ano de estágio.
Vejo-me triste, abandonada e só
Bem como um cão sem dono e que o procura,
Mais pobre e desprezada que Job
A caminhar na via da amargura!
Florbela Espanca, Livro de Soror Saudade
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